Alexandra e Ana Rita falam do caminho entre um esboço de papel e o objeto feito à mão
Alexandra Gonçalves e Ana Rita Aguiar são as mais recentes criadoras do Projecto TASA. Estas duas jovens designers de produto, com experiências internacionais e múltiplos projetos na sua bagagem, aceitaram o desafio de trabalhar com artesãos algarvios na criação de 12 novos produtos desta marca, que serão lançados em setembro. Uma experiência única e uma aprendizagem muito enriquecedora, como testemunham na entrevista.

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Como é que se combina design com artes tradicionais nos projetos? É um desafio estimulante?
Alexandra: As artes tradicionais do Algarve possuem um valor cultural e patrimonial relevante para a região. Eu já estava bastante familiarizada com muitos artefactos e produtos do artesanato local mas houve um trabalho de pesquisa e diversos momentos de interação com os artesãos nas suas oficinas. É importante conhecer as pessoas, o seu ambiente de trabalho e a sua forma de expressão. Muitas vezes passamos também a conhecer parte da sua história de vida. O processo de design começou desde os primeiros contactos com os artesãos, de forma simples – da perceção da habilidade à criatividade.
Ana Rita: É sem duvida um desafio estimulante, criar produtos diferentes, com formas e linhas contemporâneas com matérias que há anos e anos são utilizados para determinados artigos e formas com que os artesãos estão familiarizados. Mas é algo que me fascina, a vontade e disponibilidade dos artesãos em querer mudar e acompanhar as tendências dos dias de hoje.

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E na prática? O que é vos surpreende na realidade, quando passam dos projetos à prática, dos desenhos à mão do artesão?
Alexandra: A fase mais interessante da colaboração designer/artesão é o caminho que se faz entre um esboço de design numa folha de papel e o objeto real elaborado à mão. Pode ser um caminho curto e simples ou um trabalho mais atribulado. Os primeiros desenhos são sempre propostas “abertas” e o desenvolvimento do produto é um processo que engloba várias experiências e alterações desde a primeira ideia – mas é sempre um trabalho enriquecedor para todos os envolvidos. É frequente surgirem questões inesperadas e relevantes que resultam dessa interação entre os designers e os artesãos. E, no fundo, essas soluções que se estabelecem durante o processo, fortalecem a identidade dos produtos.
Ana Rita: Existem sempre contratempos. Só a conversar e a experimentar é que conseguimos perceber as dificuldades e depois ultrapassá-las encontrando novas soluções. Ou o artesão vê que não é capaz de o fazer, ou muitas vezes é o próprio material que não nos deixa continuar com a nossa ideia inicial.
Qual foi a vossa metodologia de trabalho na conceção dos produtos do TASA?
Alexandra: A primeira fase foi um trabalho de pesquisa e de conhecimento profundo do artesanato da região, das técnicas utilizadas no seu fabrico e dos artesãos integrados na rede TASA. Também foi importante conhecer a origem do TASA, os produtos que foram elaborados em fases anteriores e a visão da equipa atualmente responsável pelo seu desenvolvimento. No sentido de dar continuidade ao trabalho realizado anteriormente, foi necessário reavaliar as necessidades do projeto em termos de novos produtos e métodos de fabrico e a partir daí construir propostas coerentes com esses objetivos.
Ana Rita: Primeiro tive de saber que produtos o TASA gostaria de ver desenvolvidos, depois passei ao contacto direto com os artesãos e perceber que técnicas e matérias estariam disponíveis para trabalhar, conhecer as tendências e o que o público procura. A seguir foi desenhar, desenhar, desenhar e voltar a desenhar até encontrar produtos que me agradassem a nível da sua funcionalidade, de junção de diferentes técnicas e matérias e da sua beleza e simplicidade.

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Onde é que se inspiraram e que tipo de olhar queriam trazer de novo?
Alexandra: A inspiração pode surgir em momentos muito diferentes do processo criativo. Existiram diferentes formas de abordagem nas novas propostas de design. A primeira foi pensar em novos objetos criados a partir de técnicas artesanais que lhes proporcionam por si só um forte valor tradicional. A outra forma foi pensar em objetos que possuem uma dimensão simbólica criada por influência da valorização cultural de características da região. Ou ainda criar um apelo à memoria de produtos com história do artesanato local. Existiu também a preocupação de juntar materiais diferentes no mesmo produto de forma a fomentar o trabalho colaborativo entre artesãos e a experimentação.
Ana Rita: Inspirei-me nos artesãos que conheci, nas suas fortes personalidades, inspirei-me na serra do algarve, que tem uma beleza única e que muita gente não conhece, inspirei-me na flor de “esteva”, uma flor linda e delicada, que nasce no meio da robustez da montanha. Quis criar produtos simples, como uma “fruteira”, produto que muitas vezes é feito em plástico ou com matérias pouco nobres, em que o fundamental é trazer um novo olhar, um olhar único, usando matérias de qualidade, fazendo uma junção improvável de materiais, cuidando do seu acabamento. O facto de ser feita à mão confere-lhe um fator de exclusividade.
O que é que o design aprende neste processo todo? E vocês?
Alexandra: Projetos como o TASA promovem um design mais consciente. Aprende-se sobretudo a pensar no desenvolvimento das atividades artesanais com uma visão mais integradora e responsável, bem como no desafio da renovação e valorização deste sector num contexto de futuro.
Ana Rita: O design aprende que nem tudo pode ser como ele quer, porque existem fatores como os materiais que o limitam, na sua forma ou na sua função. Para mim como designer, foi muito estimulante trabalhar com pessoas que têm anos e anos de trabalho e que me ensinam coisas maravilhosas, pessoas com alguma idade, dispostas a ouvir uma “pirralha” e dispostas a experimentar e a fazer algo diferente. Isso deixa-me muito contente!
Conheça a história de ambas as designers aqui: Alexandra Gonçalves e Ana Rita Aguiar.