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Um novo tempo para a arte do latoeiro

“Parece que ainda há pouco tempo se ouvia o som do latoeiro…”. Há um pensamento que fica suspenso nos rostos de uma comunidade onde se vai constatando o desaparecimento de um ofício tão integrante da sua identidade.

TASA_Arte do latoeiro

O tempo traz a perda e também o sentido da urgência. Lamentamos não ter chegado a tempo de envolver o Sr. Raúl numa ação de ensino. Foi o último latoeiro de Messines, uma pequena vila no interior do Algarve. Corremos contra o tempo na procura de soluções para não deixar estes ofícios tradicionais desaparecerem. Sentimos a urgência porque trabalhamos diariamente com os artesãos e por causa deles. E temos por isso uma melhor visão, no horizonte, da iminente perda e do que ela acarreta.

TASA_arte do latoeiro

Em S. Bartolomeu de Messines, o tempo conjugou-se no presente, concertando todas as oportunidades, numa derradeira tentativa para reativar a latoaria. O Sr. Raúl deixou como legado ao município todas as ferramentas e equipamentos da sua oficina. Descobrimos um latoeiro do concelho de Odemira que se manifestou disposto a ensinar. Concorremos e ganhámos um prémio do “Programa Tradições”, da EDP, que deu um contributo financeiro, juntamente com a Câmara Municipal de Silves, para pôr em prática o projeto “A arte do latoeiro”. A Junta de Freguesia de Messines improvisou uma oficina e foi lá que durante dois meses se ensinou a arte da latoaria, num modelo de transmissão de saberes mestre-aprendiz.

Os cinco aprendizes têm percursos e histórias de vida variados, mas em comum o fascínio pela latoaria e a vontade de a integrar nas suas vidas. Há um jovem filho da terra e de artesãos. Um designer que escolheu viver na harmonia da ligação à terra. Um carpinteiro, emigrante recentemente regressado às origens. Um economista que decidiu construir um projeto de ecoturismo. E um autodidata da latoaria, verdadeiro apaixonado, que passou os últimos anos a tentar aprender através de vídeos na internet.

A transmissão das técnicas base do ofício assentou no aprender fazendo: passar um molde para a chapa, cortar, enrolar, fazer encaixes, enrolar, cravar, soldar, fazer asas e acabamentos. Os aprendizes fizeram uma incursão por alguns artefactos do repertório tradicional da latoaria: baldes direitos, baldes cónicos, enfusas, almotolias e funis. A inovação foi introduzida através do estudo para prototipagem de produtos onde a latoaria é adaptada à realidade atual.

Incluímos no programa, um workshop com o único jovem latoeiro a trabalhar em Portugal. Rui Santos veio de Vila Real de Trás-os-Montes ensinar como se fazem almotolias em flandres à moda do Norte.

TASA_latoeiro_Wks com Rui Santos

Durante dois dias da formação passou-se de cinco para cerca de oitenta aprendizes. Alunos de quatro turmas de escolas do ensino básico da freguesia de Messines puderam experimentar o ofício. Fizeram um molde em cartão de um funil, mas o que mais os entusiasmou foi explorar os vários utensílios, moldar formas na bigorna, usar a fieira, os martelos e participar da azáfama da oficina. Envolver as artes tradicionais nos planos de atividades (e até curriculares) das escolas é, acreditamos, essencial para a sustentabilidade dos ofícios. E tratando-se de experiências novas, atividades práticas, com ligação à identidade local, a motivação é garantida!

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O tempo foi claramente insuficiente. O modelo é o correto. Manter uma ligação próxima entre aprendiz e mestre, mas possibilitar tempo para repetir, aprender no ciclo tentativa-erro. Introduzir o design em tutoria ao longo de um processo mais longo. Estas são algumas ilações a retirar da experiência. Mas mesmo assim “aprende-se todos os dias”. Afirma-o António Mestre, um latoeiro com 50 anos de experiência.

TASA_Arte da latoaria

O projeto continua agora com a fase de prototipagem de novos produtos que irão dar outras perspetivas e abrir um novo ciclo para a latoaria. Seguirá com a edição de um documentário sobre esta ação, um workshop com a comunidade e um evento final de apresentação, em Agosto.

As entidades envolvidas (Proactivetur/Projecto TASA, Câmara Municipal de Silves e Junta de Freguesia de Messines) estão a trabalhar num plano de incentivos à continuidade dos novos latoeiros, envolvendo os próprios na construção de soluções nesta fase inicial em que é preciso continuar a “ensinar a mão” ao mesmo tempo que se garante alguma capacidade de produção. A oficina e equipamentos estão garantidos até ao final do ano, existe já uma carteira de encomendas e propostas para participação em vários eventos de promoção. Tentaremos também encontrar uma solução para continuar a formação, em ciclos de especialização.

Acreditamos que, agora sim, é possível levar a latoaria a mercados que a valorizem, afastando, deste modo, o horizonte da iminente extinção de mais um memorável ofício da região.

E a latoaria é um entre vários ofícios a incluir na luta contra o tempo.

Projeto TASA – Técnicas Ancestrais Soluções Atuais
  • PROMOTOR:
    CCDR
  • GESTÃO DO PROJETO:
    ProActive Tur
  • APOIOS:
    Algarve 21